Quando saí a primeira vez do Piauí, na década de 60, fui morar em Recife num bairro chamado Afogados. Sabia da origem do nome do bairro, criado em cima de um aterro onde antes era um braço de mar de um daqueles rios de lá. Nos três anos que ali morei me vi no meio de uma rua alagada com água pela canela, pelo menos uma vez. Não me lembro se minha casa, na verdade um apartamento no andar térreo de um prédio de dois andares, de frente pra um desses braços de mar, que “enchiam e secavam” diariamente por conta da maré, quando essa subia ou baixava, chegou a ser inundada. Chegara na capital pernambucana no ano de 1960, assistindo pela televisão às filmagens de avião da enchente do Rio Jaguaribe, ameaçando arrombar a barragem de Orós, no sertão cearense. Antes na viagem passara por uma cidadezinha então pequena chamada Picos, submersa ou quase pelas águas que naquele ano foram em excesso em todo o nordeste. Quando morei em São Paulo na década de 70, não vi essas inundações que hoje a qualquer respingo de chuva transbordam infernizando uma população já castigada por malufes, serras e kassabs... A cidade nessa época era inundada por buracos do que hoje é o Metrô. Teresina, Manaus e Brasília, foram outros lugares grandes onde morei mas não me lembro de me ver no meio dessas tétricas situações que a televisão não pára de mostrar. Há quem ache que a grande catástrofe que costumeiramente acontece no Piauí, é o próprio Piauí, pelo seu clima, pelo seu atraso, pela precariedade de quase tudo... De vez em quando tem as inundações que fazem os estragos que fizeram em Teresina e no interior dois anos atrás... Agora, dizer que a catástrofe natural que assola o Piauí é o próprio Piauí, talvez seja injusto com essa terra que a gente gosta tanto e anda pelo mundo todo e um dia quer voltar pra ela... Que diabo é que isso aqui tem que atrai tanto a gente pra ela, é um mistério pra mim... Quando a gente sai daqui, esse foi meu sentimento que sempre me fez pegar a estrada, é pra ir pra algum lugar que a gente ache que vai ser bom pra gente, pra família, conhecer o mundo, se informar, ver coisas... Confesso abestalhado pra vocês que o que me fez voltar pra cá pela última vez, talvez, foi um sentimento meio brabo de que, se aqui é o que é, o mundo aí fora não está melhor do que aqui... Enquanto der, o mundo pode me esquecer... Olho pra BR que passa aí na porta e não sinto a menor vontade de pegá-la e sumir, como já senti antes, felizmente ou infelizmente...
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